O primeiro registro bíblico explícito do dízimo encontra-se em Gênesis 14:18-20. Abraão, após derrotar os reis que haviam saqueado Sodoma e levado seu sobrinho Ló como prisioneiro, encontra-se com Melquisedeque, rei de Salém e sacerdote do Deus Altíssimo. Nesse encontro, Melquisedeque abençoa Abraão, e este, em resposta, entrega-lhe o dízimo de tudo o que havia conquistado na batalha.
Esse episódio é fundamental por alguns motivos:
O dízimo foi entregue espontaneamente, sem haver qualquer lei que o obrigasse.
Abraão reconheceu em Melquisedeque a autoridade espiritual e, ao entregar o dízimo, reconheceu que a vitória vinha de Deus.
O ato demonstrou gratidão e submissão ao Deus Altíssimo, antes mesmo da constituição da nação de Israel.
O autor da carta aos Hebreus (capítulo 7) retoma essa passagem para mostrar que o sacerdócio de Melquisedeque era superior ao levítico, pois até mesmo Abraão — o patriarca de Israel — lhe deu os dízimos. Essa interpretação reforça que o dízimo, na perspectiva bíblica, tinha um caráter espiritual que antecedia a legislação mosaica.
Outro momento marcante está em Gênesis 28:20-22, quando Jacó, após sonhar com a escada que ligava a terra ao céu, faz um voto a Deus. Ele promete que, se o Senhor o guardasse em sua jornada e lhe desse sustento, então “de tudo quanto me deres, certamente te darei o dízimo”.
Esse texto revela que Jacó já conhecia a prática do dízimo e a considerava uma forma adequada de expressar sua aliança com Deus. É improvável que Jacó tenha inventado a ideia do dízimo por conta própria. O mais natural é que ele já tivesse aprendido sobre essa prática a partir de seu avô Abraão e, possivelmente, de seu pai Isaque.
O voto de Jacó mostra que o dízimo, antes da Lei, não era um imposto religioso, mas um ato de fé, gratidão e compromisso com o Senhor.
Ao analisar os textos de Gênesis, percebemos que o dízimo não nasceu com Moisés. Ele é anterior à Lei e está ligado a princípios universais:
Reconhecimento da soberania de Deus: Abraão e Jacó entendiam que tudo vinha do Senhor.
Gratidão: o dízimo era uma maneira concreta de agradecer pelas bênçãos recebidas.
Consagração: separar a décima parte simbolizava a consagração de toda a posse ao Deus Altíssimo.
Esses princípios são atemporais e independem da legislação mosaica. A Lei apenas regulamentou algo que já existia como prática de fé entre os patriarcas.
O estudo do dízimo antes da Lei mostra que essa prática não deve ser vista apenas como um mandamento do Antigo Testamento ligado à tribo de Levi. Ela surge muito antes, na vida de Abraão e Jacó, como um gesto voluntário de fé e reconhecimento de que tudo pertence a Deus.
Portanto, o dízimo é um princípio espiritual que transcende épocas e sistemas legais. Antes da Lei, ele já existia; durante a Lei, foi normatizado; e no Novo Testamento, embora não seja imposto como carga legalista, continua sendo um sinal de fidelidade e gratidão a Deus. Assim, a prática do dízimo permanece como uma forma concreta de o crente demonstrar que confia no Senhor como provedor de todas as coisas.